Quando entro no espaço da Estação de Correios, estremeço. Por duas boas razões, aliás. O frio da climatização é imenso e o mar de gente que se apinha ao redor das paredes faz-me pensar na inutilidade da deslocação. Na minha mão o envelope branco pintado a riscos azuis parece querer dizer-me que não posso adiar mais nenhuma vez o estampilhamento. Quase grita "Não podes! Não podes!". Quando almejo a senha de vez maldigo de mim mesmo a triste espera. Tenho cinquenta e duas pessoas a quem o dever obriga a ali estar, à minha frente. É estúpida a espera, principalmente porque tenho comigo tudo o que é preciso para me separar do envelope branco pintado com riscos azuis. Os selos. Só não sei quanto é a franquia e tenho quase a certeza de que a multidão que espera não vai achar muita graça se eu atropelar a ordem de chamada para ir perguntar quanto é. Sinto um certo medo, confesso. Não decorre muito tempo até que me farte e estou naquela fracção de rodar os calcanhares e sair porta fora. Só não saio porque há gente que entra em catadupas e me é fisicamente impossível. Há um velho que me olha a implorar ajuda. Treme violentamente, espasmos físicos que me impressionam. Tenta, a custo pousar no chão um saco de plástico, mas os tremores são tão grandes e tão intensos que o saco não sossega, não pousa, não nada. Estendo-lhe a minha mão e ajudo-o a estabilizar o peso. Repete-se um calvário para abrir a carteira, coisa que eu acabo por fazer e dela extrair um vale de correios. Olho para o balcão onde uma das funcionárias se apercebe da cena. Olho-a nos olhos, intensa e provocadoramente. Pergunto-lhe, sem falar, se ela é capaz de deixar aquele homem ficar ali mais um minuto que seja. Ela não me evita o olhar, apenas me franze os sobrolhos como se me dissesse que tem medo da reacção do resto das pessoas. Faço um movimento de queixo, sublinhando um "Vá lá, atenda-me o homem, por caridade...". Ela percebe o gesto, pisca-me o olho, eu sorrio-lhe, ela chama o homem para junto dela e processa o vale. Não trocamos uma palavra, mas quando saio para a rua tenho a certeza de que somos pessoas mais felizes.
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2 comentários:
Curiosidades.
É curioso que o ar condicionado na estação de correios de Mangualde também está sempre numa temperatura de provocar estremecimentos. Deve ser política da empresa...
É fácil de perceber o porquê.
É para conservar os fregueses que esperam.
Se assim não fosse havia de ser uma coisa jeitosa o cheiro da alguns que tinham por lá "ficado".
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