22 setembro 2006

Também tu, Brutus?

Mania de escutar conversas, é feio, mas caramba, elas as conversas, estão praticamente no meu colo e não consigo sequer evitar. Pior, muito pior que ouvir é trazê-las à escrita, confessando e confirmando o crime. Puxar do vento que tudo leva (mas que também traz...) aquilo que se devia perder no espaço e no tempo em que é dito. Depois há a cenografia, elas eram ambas mulheres maduras, atraentes quanto baste (alguns há a quem pouco basta), um "je ne sais quoi" de sofisticação nada exagerado (et pour cause) que só escrevi em francês porque há um saco da Parfois que uma delas empunha que ameaça a todo o momento a minha masculinidade em cada golpe que lhe é imposto. Não me posso distrair com ele, nem com a dona, por um instante que seja. "O meu é um bruto, quando me salta para cima, deixa-me sempre toda marcada...". O que é que se espera de um homem, ali entalado (literalmente) que não seja uma interpretação dúbia? Eu, a dar comigo a medir volumes, formas, gestos e na falta de algo mais distractivo, a imaginá-lo a ele, o bruto, a saltar-lhe para cima, quem sabe se a rasgar-lhe algo, ou ainda algo mais que afinal ele é um bruto, e as palavras não são minhas, apenas conservo os actos e as omissões. Procurei-lhe os olhos, ainda no ar vibravam os restos da frase, abafados pelas paredes demasiado estreitas de uma cabina de elevador. Cumpriu-se ali mesmo o protocolo do olhar, as luzes que se entenderam como faroleiros à conversa noite dentro. Ela alcançara o segundo sentido da frase. Corou como uma gaiata que se sente apanhada. Levou os dedos aos lábios em sinal de arrependimento e baixou os olhos. À saida do elevador, ainda a ouvi balbuciar "é um pastor alemão...". Seja. Que eu cá não perguntei nada.

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu não tinha aguentado e escangalhava-me todo a rir... Ou então morria sufocado de suster a respiração para não largar uma gargalhada... Devia ter aconselhado o corte de unhas do Brutus como na anedota... Ou então a castração.