23 setembro 2006

Tecnologias

Recebi esta mensagem há pouco tempo. Por ser um assunto que me fascina, gostava de reflectir publicamente sobre este tema. Trata-se obviamente da eterna questão dos homens serem preferencialmente capazes de arranjar coisas. Leiam o que me foi enviado, e depois acompanhem-me no meu raciocínio, que virá logo a seguir.

..."O que eu invejo essa capacidade, acredito que masculina, de compreender as máquinas mesmo quando elas estão em estado terminal. Quando algo não trabalha por aqui o que penso logo é como arranjar o dinheiro para comprar uma nova e como enviar a que está "mortinha" para a reciclagem. Chamar alguém para arranjar nem pensar. É caro e demorado. Saber como fazer dava jeito mas a falta de curiosidade por essas coisas é notória. Fica a inveja."...

Não creio que os homens sejam especialmente dotados para questões técnicas ao nível da bricolage. Conheço muito pai de família que treme literalmente ao som das palavras "chave de fendas", ou "interruptor eléctrico". Conheço também algumas mulheres a quem as mesmas palavras não incomodam um cabelo que seja e que podiam discutir comigo temas tão interessantes como "apalpa folgas" ou "chave francesa". Não é por aí... A grande questão que se me coloca (e são várias, não apenas uma...) está muito mais em a) Como é que uma pessoa que consegue distinguir um "ponto de caramelo" de um " ponto de pérola" tem medo de desaparafusar uma tampa de uma máquina? Qual é a dificuldade de abrir uma torneira e substituir uma válvula ou um castelo quando comparado com o acto de deitar cera quente nas pernas e puxar com força?

Creio firmemente que se trata de uma questão lógica, um parafuso é um parafuso e só tem dois estados: aparafusado ou desaparafusado. Quando olho para um parafuso a única pergunta que faço a mim mesmo é: Fenda ou Philips? A maior parte das mulheres que conheço perguntarão face ao mesmo parafuso "Porque é que eu ainda não me casei?". É óbvio que a pergunta feminina tende a ser evasiva (o acto de estar casada permitir-lhe-á sempre dizer ao esposo coisas tão motivadoras como "os maridos das minhas amigas arranjam tudo lá em casa"). Os homens depois de terem feito a mesma pergunta saiem disparados para a caixa de ferramentas sem se deter em mais nada, as mulheres tendem a olhar para o espaço envolvente do parafuso e a pensar "Meu Deus isto está um nojo!" e enquanto limpam e deixam o parafusinho a brilhar, já perderam a motivação em aprender a diferença entre um parafuso de fenda e um Philips. Duvidam? Tentem pedir a uma menina que vos explique a lei do fora de jogo posicional e depois logo falamos. Para mim é absolutamente incompreensível que as meninas achem as questões mecânicas complexas. Muitas delas dizem-me que "nunca tive inclinação ou curiosidade para isso". Em que momento da vida tiveram inclinação ou curiosidade para aprender, por exemplo, a casear? Ou a fazer um cós perfeito? Ou a saber até que profundidade se espeta um palito num bolo para ver se já está cozido? (Tudo coisas que me traumatizam desde a infância...). tentem pedir a um homem que ponha rímel nas pestanas enquanto conduz sem espetar o pincel (tecnicamente aquilo não é um pincel, mas não é agora altura de estabelecermos a diferença técnica...) num olho. Com algum treino o homem chegará lá! (Levou milhares de anos a ser treinado a ir passear o cão ou a despejar o lixo, por isso é uma questão de tempo...). Perceber o funcionamento de uma máquina, por muito complexa que seja, está ao alcance de qualquer um, tenha ele o sexo que tiver. É isso mesmo, capacidade de observar. Não me vão agora dizer que as meninas não têm capacidade de observação, pois não? Alguém que me consegue explicar com detalhe, três horas depois de o ter visto pela última vez, todas as nuances do vestido que levava a noiva, especificando os motivos das rendas, o brilho excessivo dos brincos que não condiz com o baton usado e muito menos com a cor dos sapatos (Santo Deus, alguma vez conseguiram ver a cor dos sapatos de uma noiva com vestido de cauda?), isto para não falar da inacreditável capacidade de retenção de dados de comparação dos fechos das malas (Viste como o fecho da mala da madrinha era igual ao da mala dela?). Claro que quando me falam disto eu bem tento rebobinar a minha cassete de memórias e tudo quanto consigo recordar era o decote da segunda dama de honor a contar da esquerda que tinha descuidadamente a alça negra do soutien à mostra e de quem não conservo a mais leve memória sobre a cor dos cabelos... Isto, meus caros é a capacidade de observação feminina! Também não é por aqui, correcto? Por isso não entendo esta "dificuldade" das questões técnicas, sobre as quais já me alonguei bem mais do que tinha pensado. Esta semana, e só para me contrariar, encontrei uma criatura deliciosamente feminina, que me falou de construção civil, pladur e MDF como se fosse a coisa mais natural deste mundo. Até lhe perguntei se ela a seguir me ia dizer que lia "A Bola" ao pequeno almoço...

20 comentários:

Anónimo disse...

não há muito tempo e por algum motivo que agora não me lembro apareceu num noticiário uma estudante de engenharia mecânica que "sonhava" exercer a sua profissão entre motores diesel ou gasolina, motores de arranque, correias de distruibuição, velas, etc etc.

lembro-me como se estivesse a ouvir hoje os comentários dos presentes (numa qualquer refeição em família):
"não sabe ela como vai ficar com as mãos!" - proferiu a pequenina (em estatura) senhora que me mostrou o mundo.

engraçado que o meu pai ao longo da sua longa carrerira profissional sembre tratou dos veículos de metade da cidade e arredores. nas suas mãos abundam cortes e pele seca que nem a melhor cliníca de dermoestética conseguiria recuperar. com isto será agora interessante que os meus pais se acompanham nos laços do matrimónio faz este ano 25.

E se fosse ao contrário? Talvez pouca coisa mudasse. Talvez apenas tivesse que proferir:
"mãe, depois tens que ver como estão as bombites!"

Pedro Aniceto disse...

O sentimento de "rewarding" que se tem numa reparação, não é? Eu penso que uma reparação é sempre uma questão pessoal. Eu comecei a minha carreira profissional como paquete de uma empresa que vendia e reparava relógios de ponto. Nunca tinha mexido num antes, mas era francamente bom a resolver os meus problemas de concepção de modelos de "Meccano". Aquilo tornava-se uma questão pessoal entre mim e a máquina avariada...

Anónimo disse...

caro Pedro, acredite ou não penso firmemente que há um diálogo (ou talvez fosse mais correcto empregar o termo monólogo) entre a entidade que repara e o objecto a reparar.

talvez mais que isso, um desafio a ver quem será o vencido e o justo vencedor.

vou talvez fazer uma comparação que não pareça a mais adequada mas julgo que ainda muitos pensam que os universos de profissões masculinas e femininas são disjuntos.
desde os primórdios a arte tauromáquicaa era ofício do homem. às esposas cabia o sofrimento em silêncio frente às entidades divinas. parece-me hoje (ainda para mais oriundo de terras Ribatejanas) que está provado que também a figura feminina pode levar a melhor frente a um imponente toiro.

não me espanta nada ver hoje em dia uma senhora a fazer o trabalho que há uns anos era restrito ao homem, e julgo que só assim atingiram a igualdade que tanto procuram.

parece que o mito de ver uma senhora na construção civil, a fazer o papel de trolha, está para ser desfeito em breve.

O Gato Preto disse...

O Paulo que me desculpe, mas essa do trolha foi um pouco demais, e acho que ainda vai demorar mesmo muito, isto porque uma caracteristica que não falta às mulheres é inteligência, logo, igualdade sim, agora trolhas???? tem mas é juizo, que elas não são burras.

Pedro Aniceto disse...

Há já alguns anos recebi uma carga proveniente da Holanda que como de costume era transportada em camião TIR. Quando desci para recepcionar a carga tive um "choque" com a imagem pouco vulgar de duas criaturas holandesas que me aguardavam junto à cabine do imponente Volvo. A motorista (é vulgar encontrar motoristas de sexo feminino no longo curso) trajava saia comprida e blusa a rigor e a ajudante, baixíssima, vestia umas jardineiras de ganga e botas de trabalho... Nunca me esquecerei da dupla...

Anónimo disse...

Olha, a mim parece-me que começamos a ter aqui uma situação curiosa. É que enquanto as mulheres, encaram como um desafio a possibilidade de virem a desempenhar tarefas tradicionalmente masculinas, e por esse motivo têm, hoje em dia, o aplauso de todos(ou quase, claro!), no caso dos homens, a sua grande maioria ainda tem muita dificuldade em assumir papéis que durante muitos anos foram exclusivamente femininos. E ainda por cima os que (por vezes de forma ainda envergonhada)se aventuram por esse caminho nem sempre recebem o aplauso que merecem.

Mas penso que apesar de tudo a situação está a mudar.

Por outro lado é bom não esquecer que físicamente somos diferentes e isso tem alguma importância no que diz respeito a executar determinado tipo de tarefas.

Anónimo disse...

talvez tenha abusado na parte do trabalho de trolha ;)

por acaso por falar em camiões TIR, numas das minhas recentes deslocações à capital, vi duas senhoras com profissões tipicamente masculinas:
motorista ca carris (parece que já existem várias);
e a segunda não conheço o termo correcto, mas estava na traseira do camião de recolha de resíduos sólidos (vulgo lixo);

blimunda sete luas disse...

Hum... Se calhar é porque um parafuso ou está aparafusado ou está desaparafusado, que ele tem pouco ou nenhum interesse para uma mulher. Não?... A malta não é muito dedicada a determinismos, lá isso é verdade, é nas cambiances que a gente navega bem.

Isto faz-me lembrar uma coisa que li em tempos, que demonstra bem as diferenças entre homem e mulher: se perguntarmos a um homem o que é que ele tem e ele responde "nada", o que ele quer dizer é... que não tem nada.

Já a mesma pergunta feita a uma mulher, em que a resposta seja "não tenho nada", isso quer dizer, garantidamente, que ela tem alguma coisa...

"Just for the record", eu por exemplos percebo tanto de porcas e parafusos como de pontos de pérola e de não sei quê que já nem me lembro. O que faz de mim um desastre simultâneo na mecânica e na culinária.

Cuidado com as ideias-feiras ó fáxavor!

botinhas disse...

Quando olho para um parafuso a única pergunta que faço a mim mesmo é: Fenda ou Philips?
A pergunta não deveria ser: rosca inglesa ou das normais?
Quem nunca tentou desaparafusar um parafuso dos "anormais" e não conseguir, chamando todos os nomes ao sacana do inglês que possivelmente o apertou com demasiada força?

Pedro Aniceto disse...

Regra #1 para determinar o tipo de rosca: Se a peça que fixa o parafuso é sujeita a algum tipo de tracção clockwise, há GRANDES hipóteses da rosca ser esquerda...

Pedro Aniceto disse...

Ganhei o meu dia! Eu cá não sei cozinhar, mas sei mudar pneus!

blimunda sete luas disse...

Ah, mas mudar pneus também eu sei! É só ligar para a ok teleseguro e falar com a Marta!

Pedro Aniceto disse...

Quando li a primeira frase ia chamar-te(lhe) mentirosa... (Porque me lembrei de um pneu furado há muitas luas atrás), mas depois contive-me! ;)

Pedro Aniceto disse...

Paulo A.Silva: Há imensas mulheres a trabalhar como cantoneiras de limpeza em Lisboa. Já foi, é certo, um trabalho exclusivamente masculino. Outra das profissões por quem nutro ENORME respeito é a de calceteiro, muito por culpa das condições incríveis (climatéricas, de postura e não só) em que têm de trabalhar. Há dias numa reparação de um passeio da minha rua, encontrei acocorada a partir pedra, uma senhora.

Pedro Aniceto disse...

Mikas... Mikas... Sabes mudar pneus e fazer mousses de chocolate? Corres sérios riscos de seres eleita "esposa do ano"! (Já sei que não sabes fazer mão de vaca com grão, o que é um handicap horrível!) ;)

Anónimo disse...

Curiosa esta discussão... Acho que se trata de pre-disposição prás coisas. Por exemplo, o que eu gosto de comer, não acredito que não poderia vir a saber cozinhar..... No entanto não sei cozinhar. Outro exemplo, que me deixou furioso: a minha querida esposa insiste que "não percebo nada de computadores", mas não saber qual é o botão do lado esquerdo do rato ou qual é o lado do cd que deve ficar para cima quando se introduz no computador...... é de me provocar urticária, no entanto sabe cozinhar...

Pedro Aniceto disse...

E o que dizer, meu caro A.Carrilho quando se insurgem contra "a fiarada" que tens aí arás da mesa, mas que passam a ser "as minhas lãs" quando se trata de as dobar?

Anónimo disse...

Pois.... O meu par de sapatos no meio do quarto são a "desarrumação completa" oS cinco pares dela são o "estou-me a vestir".... Bah... deixa para lá!

Anónimo disse...

E a receita dessa mousse pode ser divulgada?

Pedro Aniceto disse...

Que raio de pergunta, Daniel! Então não conheces as duas leis fundamentais das receitas de cozinha? Lei 1: Nunca contes tudo o que sabes.