28 setembro 2006

Um momento de cansaço, pois é bem melhor assim

Pois eu cá duvido que haja chão mais fértil para colheita de pequenas histórias do quotidiano do que numa bem portuguesa sala de espera de um qualquer Centro de Saúde. Não que eu tenha estado num recentemente, felizmente não, mas a pessoa que estava do outro lado do telefone aos gritos com a sua mãezinha, essa sim sentada ao meu lado, estava num, pelo menos a julgar pelo que ia ouvindo. Não era uma conversa muito excitante, pelo menos para mim que não faço a mais pálida ideia de quem esteja do outro lado, mas já me repito se disser que ela estava aos gritos, falava tão alto que quase não precisávamos do telefone e satisfazíamos mais depressa a nossa curiosidade natural. Ficámos então a saber dos achaques de índole gástrica, a mãe a perguntar "foi comida?" e eu a lembrar-me da chalaça do "Foi sim, mas casa para o mês que vem", das dores nas "partes" (coisa que muito me entusiasmou porque desconhecia o uso do termo para a genitália feminina), enfim, um tipo está sempre a aprender e neste caso a preencher páginas e páginas de tratados de medicina que é sempre uma mais-valia quando já se leu o jornal e temos pela frente mais umas horas na Loja do Cidadão... Revi os papéis, o correio do dia, a minha Companhia de Seguros escreveu-me dizendo que vão "rever o prémio" (Desculpem-me, mas o que eu pago é um prémio para quem?) e dediquei-me à escuta ambiente, o último dos passatempos lúdicos. A conversa continuou, percebi que a mãe tinha um vocabulário limitado a uns "sim", "não", "humm..." e pouco mais. Só voltei a arrebitar a orelha quando ouvi um sonoro "Mas tu foste onde, Maria Luísa?". Mãe que se preze sabe bem que o uso dos nomes próprios tem uma absurda carga punitiva e é prenúncio de sentença de risco. "Tu foste a uma igreja católica?". Percebi que sim, que fora. A mãe estava escandalizada, não sei porquê mas pouco me importa, procurava apoio nos outros olhares até ter encontrado os meus. Desligou o telefone, completamente amofinada e enquanto guardava o aparelho na mala, descansou-me (pensou ela), fitando-me bem ufana, "entrou numa igreja católica sim, rezou, mas disse-me que não tinha olhado para o boneco!".

2 comentários:

Marta disse...

Centros de Saúde é do melhor!!! Ainda há dias "postei" sobre isso.

Então não é que ainda outro dia, no SAP (7 Rios), andava uma médica à procura de material de trabalho (lanterna e + qq coisa) para poder dar consulta a uma criança e não havia?! Não encontravam em lado nenhum! Nada. E o SAP a encher... :/

Dizia a senhora recepcionista (que elas têm sempre mto boa vontade) que já tinham "mandado comprar mas..."...

Surreal.

Frederico Lucas disse...

Há coisas que só te acontecem a ti.
...Ou então, só tu é que dás por elas!