Quando alguém me diz "Pedro, isto deve interessar-te" eu tremo. Apesar de não sofrer de nenhuma espécie de doença ou patologia que me inspire tremores, fico sempre num estado de nervoso incontrolável porque a isso me leva a curiosidade natural com que a Natureza me resolveu dotar. Por isso, quando J. me disse que andava a estudar aramaico e que "isto te deve interessar" comecei a tremer de curiosidade. Ora, parece que os arames (?) (Um tipo que fala aramaico podia muito bem ser um arame...) não tinham uma palavra que definisse o conceito "muitos" ou "muitas". Parece-me incrível, quem sabe uma falsidade, mas foi assim que me venderam o peixe e eu limito-me a congelá-lo e a revendê-lo até que a ASAE me feche a porta. Em vez desse singelo conceito de quantidade parece que usavam o número 40 para fornecer a ideia quantitativa. Segundo os estudos de J. alguns mal entendidos se formaram. A ideia de ter chovido durante quarenta dias no Dilúvio Universal parece que mais não era que "choveu como o caraças durante muitos dias". A ideia de Jesus Cristo ter ido meditar para o deserto durante quarenta dias pode também ser uma derivação desta aramaica mania. Estou disposto a tirar a limpo o tamanho da quadrilha do Ali Babá. Afinal parece que não eram quarenta, eram apenas bastantes...
19 dezembro 2006
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9 comentários:
Epá isso vem modificar consideravelmente os conceitos, é uma imprecisão terrível, ficaremos para sempre na dúvida, sobre o dilúvio, sobre dias de jejum de Cristo e ainda me ocorrem mais dois milagres, pelo menos, que se referiam a grandes quantidades: o do vinho nas bodas de Canã e o da multiplicação dos pães e dos peixes.
Pedro, que idade tens? 40 ou muitos? ;)
Bastantes e dois!
Parece -dizem, que o meu Aramaico nem preso por arames!- que as línguas semíticas do Antigo Testamento se prestam, por sua natureza, a incontáveis equívocos deste género. E apesar de incontáveis, contarei, como exemplo, dois: a ambiguidade, logo a abrir, de "No princípio Deus criou os céus e a Terra", que pelos vistos também dará, no original, para descodificar como “No princípio OS DEUSES criaram… etc” (& so much for a invenção do monoteísmo!); e o passo do Cântigo dos Cânticos em que a noiva diz “Sou negra, e sou bela” e o São Jerónimo decidiu que em Latim deveria ser “Sou negra, mas sou bela”! Contas, enfim, de um longo rosário de equívocos ao longo da História da Tradução.
João Paulo Moreira
Há tb aquela do camelo e do buraco da agulha. Parece que se referia a uma porta de entrada nos muros da cidade, que era muito estreita e só deixava passar uma pessoa de cada vez. Com esta nova versão, deixa de ser impossível um rico entrar no reino dos céus, fica só difícil, mas possível.
Fica responsável pela minha primeira gargalhada de 2007. Abraço
Gente, o Novo Testamento foi escrito em GREGO, não em Aramaico. O livro do Génesis (onde está descrito o dilúvio) foi escrito em HEBRAICO, não em Aramaico. O Aramaico é muito mais recente que o livro do Génesis.
Em HEBRAICO garanto-vos que existe palavra para muitos, por ex.: רַב (rab). A palavra para 40 no texto do dilúvio é אַרְבָּעִים (’arba`iym), que não tem outra tradução que não 40 (é das poucas palavras na Bíblia que só tem essa tradução). Além disso, a Bíblia diz-nos em que dia de que mês começou a chuva e em que dia de que mês parou e em que dia de que mês conseguiram sair da arca.
Em GREGO também há palavras específicas para os números, como todos devem saber. A palavra usada no texto do jejum é τεσσαράκοντα (tessarákonta) e significa (tcharam!) 40!
Não posso ajudar muito com aramaico, infelizmente. Mas o aramaico só é usado no Velho Testamento (espero não errar) em algumas poucas passagens (por ex.: fim do livro de Daniel, Ezequiel e pouco mais).
A única dúvida que poderia subsistir daquelas que colocaram diz respeito à questão de Génesis 1:1 e essa é desmontável bem rapidamente: alguém já ouviu falar em plural majestático? ou na doutrina chamada da Trindade?
Antes que perguntem: não, não sou padre, nem sequer católico.
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