15 março 2007

Times of trouble


C. é profissional de ilustração. Não me parece ser uma utilizadora novata, longe, muito longe disso, mas num momento de infelicidade, após uma sessão de "arrumações" no disco rígido (como ela mesma definiu), foi tocada pelo azar. E que toque! Escolheu, erradamente, o disco a inicializar e numa fracção de segundo, aquela fracção angustiante que sempre nos atormenta desnecessariamente sempre que escolhemos um disco para inicializar, mandou para o espaço 90 GB de informação. Imagino-lhe o pânico. Trabalhos em curso, registos contabilísticos de clientes, orçamentos e tutti quanti... Eu disse que C. não era uma amadora nestas coisas. Teve o cuidado de recorrer a um disco externo para copiar a informação, ficheiros que salvaguardou. Acabada a arrumação, despejou o conteúdo do disco no lixo e decidiu inicializá-lo. Terá sido esse o momento fatal. Apesar da frustração e de algumas lágrimas (eu nem preciso de inicializar um disco sem backup para chorar, basta-me pensar nisso), C. foi serena o suficiente para pensar friamente na recuperação dos seus ficheiros. Adquiriu o Data Rescue (que, à semelhança do FileSalvage, faz o escrutínio de todos os ficheiros apagados para os ressuscitar no sistema) e ficou à espera. Disse-me C. que pouco dormiu esta noite, possivelmente entre a angústia da espera e o pesadelo de trabalhos para entregar. Das dez da noite de ontem às dez da manhã de hoje, o Data Rescue cumpriu o seu papel e trouxe ao mundo dos vivos do sistema cerca de 90 GB. É claro que C. vai ainda ter bastante que sofrer, nomeadamente na rearrumação de toda esta informação que o Data Rescue "amontoa" numa pasta sem qualquer organização hierárquica. Pelo menos o pior parece já ter passado.

P. é uma famosa guionista de televisão. Trabalhava num argumento que já tinha cento e setenta páginas sem alguma vez ter efectuado um único backup. A confiança no equipamento com que trabalhava era de tal modo cega que confessou que nunca fazia cópias de segurança a trabalhar em Word. Calhou na situação nunca ter dado cópias a ninguém, ao contrário do que é costume entre guionistas que partilham trabalho. As condições perfeitas para uma tragédia. The Perfect Storm. Aquilo que só acontece aos outros. Tinha sido bastas vezes avisada que um simples "Save As..." com outro nome significava a diferença entre um aborrecimento e um desespero. De nada serviu. No decorrer de uma operação normal, em vez de um "Save As..." decidiu fazer algo que é absolutamente lógico. Um "Select All", e um copy/paste para o interior de outro ficheiro. Num ápice, as cento e setenta páginas de um argumento que levara semanas a escrever desvaneceram-se. Inexplicavelmente, até porque a operação parecia segura.

Não é a primeira vez que vejo um "Select All" mastigar (e digerir) páginas de texto, aliás conheci o Nuno Markl no meio de uma tragédia em tudo igual. Por qualquer razão que desconheço (mas compreendo) o "Select all" parece reunir mais adeptos que um simples "Save As...".

É fotógrafo. Chamemos-lhe V. Recebeu de uma cliente um iPod com duzentas fotografias para retocar e imprimir. Depois de arquivadas no iPod a cliente apagou do seu computador o set original (!). Talvez por falta de espaço, talvez por não lhes ter amor, ou pelo menos o suficiente. V. que pouca prática tem de iPod, ligou-o e decidiu iniciar o trabalho naquele conjunto de imagens. A mensagem "DO NOT DISCONNECT" no display do leitor não era suficientemente atemorizadora. Desligou-o "porque sim" e quando tentou saber do paradeiro dos ficheiros, estes tinham-se volatilizado. Talvez no céu dos bytes, pensei eu, sem coragem de lhe contar o triste esperado desfecho.

Não há nenhuma analogia entre os casos de C., de P. e de V. São apenas três exemplos dos doze (!) casos de gente à beira de um ataque de nervos que comigo contactaram nos últimos dez dias. Uns por azar, outros por desconhecimento absurdo e que pagaram caro por isso. Segurança. Trabalhar em segurança. Porque não é apenas na construção civil que ocorrem tragédias. Essas são apenas as que servem para abrir Telejornais.

15 comentários:

Satri disse...

Ainda bem que correu tudo pelo melhor.
O Easy Recovery Professional da Ontrack tb é um excelente produto para estes casos.

Abraço

Anónimo disse...

Portanto, pelo que eu estou a perceber, desde que não tenhamos um primeiro nome com apenas uma consoante, estamos safos! ;-)
Abraços deste lado.

José Carlos disse...

O Toscano resumiu o problema :)

Acho que aos potenciais "colegas" dos protagonistas destas desgraças vai dar jeito o Time Machine, se utilizarem o belo do Mac.

Anónimo disse...

Eu julgo que há aqui dois problemas distintos: o primeiro é que as pessoas não se apercebem do verdadeiro valor dos seus bytes até ao momento em que por alguma razão os perdem; o segundo é que grande parte dos utilizadores confia cegamente na fiabilidade do hardware e acredita que o vai ter em perfeito estado de utilização para sempre.

Os discos morrem, as bebidas entornam-se, os Macs também se estragam, e os portáteis partem-se, perdem-se ou são roubados quando menos se espera.

Quando há uns anos fiquei sem um iBook devido a roubo, o disco externo de backups (que tinha custado um pouco a pagar) de repente pareceu-me a maior pechincha e o melhor investimento da minha vida. :)

O que é preciso é pensar em cada dia como se fosse o último dia de vida do nosso Mac, e estar preparado para os acidentes (shit happens!).

Macs há muitos (no mínimo, há nas lojas). Bytes como os vossos só há uns, e se se perderem não há mais iguais a esses numa loja. ;-)

kincas disse...

Aquela parte de apagar uma data de texto já consegui resolver com a possibilidade de fazer múltiplos Undo.
Depois do meu pai me telefonar a meio da noite que tinha-lhe desaparecido todo o índice de um livro.
Eu bem lhe dizia para ir gravando "versões", mas......

botinhas disse...

Ai os backups, os backups...
Com a ajuda do Miguel Arroz arranjei uma maneira (rude mas funcional) de fazer backups à la Time Machine way. Se alguém estiver interessado em saber como, posso fazer um tutorialzito... ;)

I... disse...

Eu estava interessada. Como é?

Penso que estas histórias deviam aparecer mais vezes, para que despertássemos para esta dura realidade (quando acontece).

Obrigada, Pedro Aniceto!

Anónimo disse...

ha dois tipos de utilizadores....os que fazem backups e os que gostariam de ter feito.

Anónimo disse...

_ Já passei por uma situação, em quase tudo, idêntica ao primeiro caso. Utilizava na altura um PC/Intel; um xpto topo de gama... até no "funeral" que lhe fiz (que foi para aliviar a carrada de nervos em que me deixou).

_ Ainda conservo o CPU como lembrança: destes, nunca mais.

Anónimo disse...

E o que dizer de uns animaizinhos que dão pelo nome de CD-RW ???
São uma maravilha para quem, como eu, perdeu o equivalente a dois anos de trabalho. Fiz back-up em cima de back-up e... gone with the wind.

Afonso Tainha disse...

Esta história arrepiou-me a espinha... Este fds resolvi mudar de atitude! (http://tinyurl.com/2tn42s) Obrigado Pedro!

cristina amil disse...

quando o meu gravador de CDs se foi à vida fiquei em panico.. para o arranjar queriam que eu formatasse o disco. Os técnicos ainda me mandaram a boca "tivesse feito backups quando o gravador funcionava!". Eu tinha feito mas estava desactualizado. Agora tenho um disco duro externo, basta um click no botão e ele faz a actualização dos ficheiros, procura tudo o que é novo e actualiza o que foi mudado. Caso apague algum documento do disco por engano é sempre bom ter o backup à mão!

Pedro Aniceto disse...

Oh Ana, isso do disco formatado, foi onde?

Anónimo disse...

Ainda no tempo tempo em que o Filemaker tinha outro nome, veio ter comigo uma senhora arqueóloga com uma disquete na mão. Nela tinha trabalhado durante 2 anos introduzindo dados do seu trabalho relativo a moedas antigas. Como também tinha um Mac em casa usava a disquete para levar o trabalho para casa. A sua confiança cega na tecnologia de ponta levou um rude golpe quando ao fim de, presumo, uns 1400 ciclos de introdução/ejecção a disquete entregou a alma ao criador. Ai ela percebeu que eatava em apuros. Consegui recuperar para ai 90% dos dados como texto sem qualquer formatação (que para mim parecia chinês) mas que para a senhora tinha caido do céu e lhe deve ter levado mais de um mês a colocar de novo minimamente em ordem. Na altura quase me beijou os pés e ainda hoje quando me vê faz uma festa. Passou a ter tudo em triplicado e em locais diferentes...

cristina amil disse...

Pedro, foi com um Compac e um gravador HP (a assistência é a mesma). Os tipos teimaram comigo que o problema era de software e até trocarem o gravador, o disco foi apagado e vários componentes e disco foram substituidos...