Há, no mundo obscuro dos processos burocráticos das empresas, uma lista bastante generosa de coisas estranhas, que não fazem qualquer sentido, quer para o utilizador (vulgo crente ou otário) que na labiríntica máquina tem de penetrar, quer para o próprio promotor, isto porque nelas nunca atentou, ou, se o fez (o que ainda é mais criminoso e digno de castigo) nada fez para corrigir a aberração. Tenho para mim que falta à maioria das empresas a capacidade suprema de calçar os sapatinhos do seu próprio cliente para perceber as imbecilidades e dificuldades que criam aqueles que lhes providenciam o sustento.
Qualquer atrasado mental, ainda que profundo, detectaria num ápice os escolhos semeados nos caminhos que o cliente tem de trilhar, não sendo condição necessária de que este último possua licenciaturas ou mestrados em Harvard, com a vantagem da despesa final ser muito menor. Mas isto, claro, sou eu que vejo, que não sendo contratado por nenhuma grande corporação, as vou vendo, aqui e ali (mais aqui do que ali), que vou elucubrando a teoria segundo a qual no minuto em que o fosse (contratado, lembra-se?) poderia muito bem ser atacado por essa estranha doença que me tolheria, estou certo, os olhos e os demais sentidos, deixando-me incapaz de ver, ouvir e sentir o que quer que fosse.
Entendo, e dou até de barato, que ao gestor seja muito mais cómodo dizer a qualquer subordinado "Trate-me disto aí", sendo que o agente que vai sofrer na carne as agruras da empreitada não há-de, por medo e por subserviência, conseguir ou saber transmitir ao ordenante as incongruências do processo de tratamento do que lhe foi pedido. Sei do que falo, pois habituei-me a fazê-lo durante toda a minha vida profissional e isso nada mais me trouxe que chatices e desgostos de várias ordens e calibres. Poucas coisas haverá mais delicadas que mostrar ao criador as mazelas e defeitos da sua obra sem que o mesmo desembainhe o martelo de Thor e aplique ao infeliz mensageiro (e nunca ao defeito!), uma real cachaporrada que há-de enfiar o portador das más novas pelo chão adentro, reduzindo-o à sua real significância. Paga mais ficar calado, e poupa o martelo ao homem.
Pelo menos assim o julgo, tendo sido muitíssimo raros os momentos em que ouvi "Bem visto, vamos lá examinar o problema e tentar perceber como se resolve a questão". Talvez noutras vidas, talvez noutras sociedades. Entretanto façam de conta que não viram, não sentiram, não penaram. Foi para isso que Deus, na sua infinita sabedoria, criou a classe profissional dos auditores. São os únicos que não são esmagados pelo martelo e ainda lhes pagam por cima...
Há umas semanas precisei de alterar uma morada de facturação de um dos serviços que compro. Nada de especial ou dramático, uma moradita. meia dúzia de letras numa linha da factura, nada que ponha em risco o universo ou a ordem natural das coisas. Telefonei-lhes. Estão a ver a morada para onde mandam as minhas facturas? Pois façam o obséquio de a mudar para outra que desde já adianto. Não? Como não? Que não, que isto não é assim tão simples, terá de fazer um fax. Não pode ser uma cartinha, um postal, não? Que não, terá de ser um fax. Azar dos Távoras, não tenho fax e não me apetece ir desencantar um cabo de telefone, configurar o software, mandar o diacho do fax. Pois, mas tem de ser assim, as regras são estas. Ah! E tem de mandar um comprovativo da morada nova, ai isso é que não tenho, já aí está no contrato desde o primeiro dia, a morada nova é a morada da instalação, eu só quero a alteraçãozinha, isso é que me fazia feliz. Nada feito, não há fax não há palhaços (isto inventei eu...) e tem mesmo de comprovar a morada (esta da comprovação de moradas também foi uma grande invenção, mas esta não foi minha) ou não posso fazer o que me pede. Baixei os braços e desisti.
Há poucos minutos passei numa rua em que lobriguei uma loja física desta empresa. Estacionei o carro e dirigi-me ao balcão vazio. Bom dia, queria alterar a morada de facturação. Sou o vosso cliente XYZ. Muito bem, e qual é a morada nova? Rua X, número Z, código postal XPTO. Está feito, em que mais posso ser útil? Não sei, pensei, talvez possas um dia explicar-me quem é que está errado. E dizer-me porque é que isto tem de ser como é.
Qualquer atrasado mental, ainda que profundo, detectaria num ápice os escolhos semeados nos caminhos que o cliente tem de trilhar, não sendo condição necessária de que este último possua licenciaturas ou mestrados em Harvard, com a vantagem da despesa final ser muito menor. Mas isto, claro, sou eu que vejo, que não sendo contratado por nenhuma grande corporação, as vou vendo, aqui e ali (mais aqui do que ali), que vou elucubrando a teoria segundo a qual no minuto em que o fosse (contratado, lembra-se?) poderia muito bem ser atacado por essa estranha doença que me tolheria, estou certo, os olhos e os demais sentidos, deixando-me incapaz de ver, ouvir e sentir o que quer que fosse.
Entendo, e dou até de barato, que ao gestor seja muito mais cómodo dizer a qualquer subordinado "Trate-me disto aí", sendo que o agente que vai sofrer na carne as agruras da empreitada não há-de, por medo e por subserviência, conseguir ou saber transmitir ao ordenante as incongruências do processo de tratamento do que lhe foi pedido. Sei do que falo, pois habituei-me a fazê-lo durante toda a minha vida profissional e isso nada mais me trouxe que chatices e desgostos de várias ordens e calibres. Poucas coisas haverá mais delicadas que mostrar ao criador as mazelas e defeitos da sua obra sem que o mesmo desembainhe o martelo de Thor e aplique ao infeliz mensageiro (e nunca ao defeito!), uma real cachaporrada que há-de enfiar o portador das más novas pelo chão adentro, reduzindo-o à sua real significância. Paga mais ficar calado, e poupa o martelo ao homem.
Pelo menos assim o julgo, tendo sido muitíssimo raros os momentos em que ouvi "Bem visto, vamos lá examinar o problema e tentar perceber como se resolve a questão". Talvez noutras vidas, talvez noutras sociedades. Entretanto façam de conta que não viram, não sentiram, não penaram. Foi para isso que Deus, na sua infinita sabedoria, criou a classe profissional dos auditores. São os únicos que não são esmagados pelo martelo e ainda lhes pagam por cima...
Há umas semanas precisei de alterar uma morada de facturação de um dos serviços que compro. Nada de especial ou dramático, uma moradita. meia dúzia de letras numa linha da factura, nada que ponha em risco o universo ou a ordem natural das coisas. Telefonei-lhes. Estão a ver a morada para onde mandam as minhas facturas? Pois façam o obséquio de a mudar para outra que desde já adianto. Não? Como não? Que não, que isto não é assim tão simples, terá de fazer um fax. Não pode ser uma cartinha, um postal, não? Que não, terá de ser um fax. Azar dos Távoras, não tenho fax e não me apetece ir desencantar um cabo de telefone, configurar o software, mandar o diacho do fax. Pois, mas tem de ser assim, as regras são estas. Ah! E tem de mandar um comprovativo da morada nova, ai isso é que não tenho, já aí está no contrato desde o primeiro dia, a morada nova é a morada da instalação, eu só quero a alteraçãozinha, isso é que me fazia feliz. Nada feito, não há fax não há palhaços (isto inventei eu...) e tem mesmo de comprovar a morada (esta da comprovação de moradas também foi uma grande invenção, mas esta não foi minha) ou não posso fazer o que me pede. Baixei os braços e desisti.
Há poucos minutos passei numa rua em que lobriguei uma loja física desta empresa. Estacionei o carro e dirigi-me ao balcão vazio. Bom dia, queria alterar a morada de facturação. Sou o vosso cliente XYZ. Muito bem, e qual é a morada nova? Rua X, número Z, código postal XPTO. Está feito, em que mais posso ser útil? Não sei, pensei, talvez possas um dia explicar-me quem é que está errado. E dizer-me porque é que isto tem de ser como é.
11 comentários:
E não é que é facto passado com o Grupo PT?
Não, não foi. É Cabovisão.
Adivinho TV Cabo, tenho em mãos o "complicadissimo processo" de alteração de NIB bancário para efeitos de pagamento.
fazes textos demasiado grandes lol...
hasta
Conta-nos lá. Dói, é?
E o comprovativo da morada? Sim, não to pediram, isso é muito grave...
O simplex às vezes é tão complex que só apetece mandá-los **dex !!!! E parece que os psedex call centrex são piores que os balconex .....
Por isso, se quer simplex, balconex !!
@Paulo, o Simplex é um programa governamental, o que é que ele tem a ver com empresas privadas e os seus métodos (burocráticos) de funcionamento?
Se formos facilitar (ao extremo) a mudança de morada no atendimento telefónico, o que impede que eu telefone e a mude? E depois, quando o serviço for cortado por falta de pagamento, pela entrega da correspondência na morada errada, quem paga as despesas inerentes à suspensão de serviço?
Acabo de "fazer" um carimbo no PS para não ter de me chatear mais uma vez nos CTT.
Tenho um aviso de recepção para levantar uma carta, remetida pelas finanças para uma firma que sou o único sócio e sou também gerente.
Pois numa situação anterior, mesmo com cópia do registo comercial da firma não me queriam deixar levantar a carta registada. "Tem de ser carimbado!".
Agora levam com um carimbo "made in Photoshop".
Carimbo esse que qualquer macaco pode fazer, levantando uma carta registada que legalmente não poderia.
Um dia numa Loja do Cidadão, pedi que mudassem uma facturação EDP em nome do meu Pai, havia muito falecido...
E em 15 segundos o fizeram!
Tive sorte?
Vou tentar o mesmo noutra Administração...
e depois conto!
Na EDP para mudar o nome da factura que estava em nome do pai do meu namorado (já falecido) pediram-me o nif dele!!
Como o sr. morreu há 18 anos e não temos o nº de contribuinte dele a factura vem com o mesmo nome, não pudémos alterá-lo...
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