28 janeiro 2008
A arte da Inconveniência
De há anos a esta parte que me culpo de uma coisa que parece ser sina minha, o facto de de quando em vez conseguir acertar em cheio em situações a que poderia escapar se aguardasse apenas alguns minutos ou horas. Chamo-lhe a arte da inconveniência e passa necessariamente por uma incrível falta de fortuna. São muitas as ocasiões que guardo destes constrangimentos. Perder o contacto com uma colega de há anos e recuperá-lo anos mais tarde pode parecer motivo de alegria, mas deixará de o ser se nos descuidarmos no retomar dessa mesma ligação e formos por qualquer razão adiando a data até ao momento em que agarramos no telefone e dizemos em tom festivo "Então menina o que é feito de ti?" e ouvimos do lado de lá uma voz embargada que nos diz "ela agora não pode falar porque acaba de saber que o marido faleceu...". Ou entrar numa capela mortuária para cumprir uma obrigação moral por alguém, a de dar os sentidos pêsames à família (que não conheço) e enganar-me tragicamente no local do velório onde permaneci mais de trinta minutos, na dúvida se deveria cumprimentar a esposa do falecido pelo nome, coisa que não fiz até me aperceber que estava no velório errado... Já tive mais casos destes de acertar em eventos de forma infeliz. Emprestar um disco a um amigo e por precisar dele tentar recuperá-lo e visitar-lhe o lar sem avisar, para, chegado à porta de casa do mesmo, ser informado que o dito cujo saiu de casa "Para nunca mais voltar" segundo ela. Ainda ensaiei um tímido "e o disco? e o disco?", parece que saiu também mas não pela escada. Enfim infelicidades, azares, coincidências do destino. Acabei de acertar novamente onde não devia. Na passada terça feira em conversa de circunstância no café da aldeia, alguém me pergunta se estou doente porque me tinha visto sair do hospital da região. Pedi desculpa por não a ter então cumprimentado, "mas os meus olhos por ora não me deixam ver ninguém a não ser que venha vestido de locomotiva e terá ainda assim de apitar bastante". Inconveniente a metáfora, a mulher informa-me que tinha ido ao hospital ver o irmão que tinha sofrido uma queda, imagine-se, num comboio. Peço-lhe inúmeras desculpas, envergonho-me por acaso e hábito. É o costume, podia ter usado outra expressão, milhares de outras, mas não, saiu-me aquela, podia ter sido melhor. Não foi. Há pouco reencontrei a senhora. Quis limpar a imagem, cumprimentei-a com a deferência possível. "O seu irmão, como está? Está melhorzinho?". "O meu irmão faleceu na Quarta...". Coro, encabulo-me, rai's parta! Disfarço, olho para o lado, que o café entrou em êxtase. "Olha" digo "foi golo do Sporting!". "Coitado" diz ela "ele era um grande benfiquista..."
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6 comentários:
Estou-me a rir que nem um perdido! Se calhar não devia... mas tem graça. :)
Não é possível! Mas é que são umas atrás das outras. Xiça!
Mas deixa lá, há sempre "O dia seguinte". ;)
Acho que sofres um bocado de Síndroma do Pato Donald...
Coitado... o que vale é que aqui contado dá para umas belas gargalhadas (mais as gargalhadas daqueles que me vêm rir com cara de parva para um monitor) , mas isso "in loco", deve ser de enfiar a cabeça na areia...
Porra, nunca tive conhecimento de alguém assim. Isso é que é azar. Bem, da última situação não tiveste culpa, era a pergunta que tinhas que fazer, mas das outras vezes... Bolas! Sabes o que se costuma dizer: "se tens medo da resposta não perguntes!"
Abraço
Infelizmente, percebo bem do que fala! O post está fabuloso!
:DD
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