04 fevereiro 2008

Vae victis! (O convite)

Convidei um utilizador de correio electrónico a experimentar um serviço. A resposta não me tomaria mais de dez segundos caso não contivesse ameaças, o que torna a coisa um pedacinho diferente. Não há coisa mais estimulante que a destruição de uma argumentação.

Caro Pedro Aniceto,
Os m/ melhores cumprimentos.
Não tenho o prazer de o conhecer e desconheço a que propósito sou destinatário deste mail !!Gostaria de saber em que base de dados recolheu o m/ endereço de mail. No prazo de 5 dias. Caso contrário, solicitarei intervenção da CNPD.
Não estou minimamente interessado em receber qualquer tipo de marketing via mail, pelo que também agradeço, desde já, que elimine o m/ endereço da sua lista.

Remetente identificado



Caro Remetente Identificado,

Surpreende-me que de algum modo desconheça o propósito do email que recebeu. Como indica em linguagem clara o assunto da própria mensagem, que recordo, era "Convite!", trata-se de um convite, acto de convidar, modo porque se convida, entre outras explicações que tomarei como certas e provenientes de dicionários de língua portuguesa de sólida e reputada fama.

Em resposta à sua intimação dos cinco dias, que deveras me divertiu, saiba V.Exa que o seu email não foi recolhido em base de dados alguma, o que embora lhe possa parecer espantoso, não é obra do demo nem fruto do acaso. Ora, não tendo sido o seu endereço recolhido numa base de dados, considero cumprida a interpelação dentro do hilariante prazo.

No âmbito da minha actividade tenho a minha própria Base de Dados registada na CNPD (da qual o seu endereço não faz nem virá, pelo exposto, a fazer parte), pelo que faça V.Exa o que muito bem lhe aprouver com a sua intimação e ameaça, e caso lhe não surjam ideias onde a aplicar, terei imenso gosto e prazer e indicar-lhe algumas.

Num mundo imediatista como o nosso interrogo-me como diabo V.Exa autoriza que os seus dados electrónicos (e refiro-lhe o email QUE REPITO NÃO RETIREI DE BASE DE DADOS ALGUMA caso não tenha entendido à primeira) constem de uma banal lista telefónica (o que é o caso), bem como, pasme-se, a sua MORADA (Céus! Que me mais me irá suceder?), o seu telefone (Santa Madre, é o fim dos tempos!) ou o seu número de Fax (Oh desgraça, oh desdita!), já para não falar do seu número de cédula profissional que por sinal é parte integrante do seu email profissional.

Interrogo-me se o escarcéu electrónico que V.Exa faria seria igual se o remetente desta electrónica missiva lhe escrevesse em papel, se seria V.Exa capaz de sacrificar meia Amazónia em abates de celulose para continuar a diatribe. Imagino o fragor da zanga, o clamor da ira, e cesso os meus imaginativos exercícios pois julgo já ter gasto com V.Exa mais electrões do que a questão de facto merece.

Voltaria ao tépido bovino para reiterar a V.Exa que de facto (e pela terceira vez) o seu email não ter sido retirado de base de dados alguma, mesmo que esses dados sejam públicos e constem da já citada e referida amarelada lista telefónica, mas não somente por isso, para lhe afiançar, capaz de jurar à fé de quem sou, lido por estas que o estojo há-de um dia guardar, que o seu precioso email não consta também de nenhuma lista (oh ameaça tamanha essa das listas). Era um singelo email, unzinho, uno e primo, divisível apenas por ele.

Pelo exposto, e por não constar o seu singelo e precioso endereço de nenhuma lista, manifesto a V.Exa o meu temeroso receio de que seja impossível cumprir o seu pedido de eliminação de uma lista que não existe.

Ofereci-lhe um serviço que V.Exa recusou. Aceito, com fair play e bonomia a sua decisão. Já o estardalhaço dispenso, por ser tolo (o estardalhaço, não vá V.Exa interpretar-me erroneamente) e fico aqui a pensar em que se um dia mudar o meu rumo profissional e vier a vender comprimidos para aumentar saberá Deus o quê ou maravilhosos relógios capazes de medir o tempo que V.Exa aqui nos fez perder, estaremos ambos bem arranjados.

Queira V.Exa aceitar os meus mais entusiásticos cumprimentos

Pedro Aniceto

18 comentários:

JedWar disse...

Posso "retirar", para possível uso, o conteúdo deste post?!!!
Julgo que com algumas alterações de sujeito e de contexto, ainda me vai fazer muito jeito....

Que conste desde já que eu pedi....ehehehe

Quack disse...

A meu ver este post tem piada por ter sido escrito para um caso específico, talvez sendo mesmo um texto de momento e que uns dias mais tarde e não teria sido escrito.
Agora utilizar como carta de notificação perde toda a sua unicidade, onde reside grande parte da sua graça.

Mas isto acho eu que gosto de achar coisas e fico completamente vidrado com este tipo de artes literárias.

m.camilo disse...

eh.eh...eh...eh....cum caraças! :)

Unknown disse...

Será que ele vai à caixa de spam e faz isso a todos os e-mails que recebe ?

r. disse...

Mas que tipo de serviço é que lhe ofereceste, hum???????

r. disse...

Será que "já sabias de antemão que isso o irritava", Pedro?
;)

Patricia Lousinha disse...

Tu nem queiras imaginar R.... ;)

Pedro Aniceto disse...

3um, autorização concedida. Não posso no entanto de deixar de dar razão ao Quack que diz (e muito apropriadamente) que a resposta foi dada a um caso específico. No calor da resposta, e tendo em consideração a profissão do visado (advogado), respondi-lhe de forma acintosa e sarcástica que foi, a meu ver, mais do que merecida por causa da ameaça. Não fosse esta e uma simples linha pedindo desculpa pelo incómodo teria bastado.

Pedro Aniceto disse...

Quack, só uma nota: Quanto mais tempo passa sobre uma resposta emocional, mais cresce a ironia e subtileza da mesma, perdendo inversamente a minha capacidade bengalar.

Pedro Aniceto disse...

Será que ele vai à caixa de spam e faz isso a todos os e-mails que recebe ?

Obviamente que não. Fê-lo comigo porque eu dou a cara, identifico-me completa e absolutamente, faço uma explicação sobre o assunto a que venho, sou claro e transparente. Nem sequer venho vender algo. É sempre mais fácil vergastar estes palermas que fazem como eu faço que responder a um nigeriano qualquer que nem a resposta lê. É um caso social, interrogo-me o que farão ao remetente de correio publicitário em papel. Provavelmente nada.

Pedro Aniceto disse...

r., ofereci-lhe um serviço destinado a utilizadores Apple, apenas isso, Nada que envolva masoquismo ou coisas moralmente abomináveis.

382 U disse...

moralmente abomináveis ou moralmente admiráveis... depende do ponto de vista.

ana v. disse...

Clap, clap, clap!
Belíssima resposta, não há dúvida. Imagino a cara do visado que, se é advogado, está habituado a ganhar sempre na argumentação...

Pedro Aniceto disse...

A quem possa interessar: O visado respondeu, manifestando huma única linha o seu contentamento por me ter feito perder tempo.

Patricia Lousinha disse...

Sendo advogado e estando como se supõe que está, devidamente inscrito na Ordem, não deve ter sido contemplado com o "comunicado" que nos deu conhecimento, ao fim de um ano e cinco meses, do protocolo celebrado entre as Páginas Amarelas e a OA.
Protocolo esse datado de Maio de 2006 e que permitiu a publicação das cédulas profissionais dos Advogados e tudo o resto. Sendo tudo o resto: a morada profissional, os números de telefone e fax, o endereço de correio electrónico e número da cédula.
Coitado do colega que nem imagina a promiscuidade de protocolos que andam por aí a ser feitos...
Eu até acho que o Pedro só fazia bem em informar o ilustre causídico. Não vá ele desatar a contar 5 dias a torto e a direito como se não houvesse amanhã!

Pedro disse...

Ele há gajos com jeito para a escrita. Muito bom.

visconde da fuzeta disse...

Bem depois de uma resposta dessas o ilustre ainda deve estar ko.
Gostei da prosa e do sarcasmo .
Depois desta o "iluminado" não se mete noutra.


Francisco

visconde da fuzeta disse...

Bem depois de uma resposta dessas o ilustre ainda deve estar ko.
Gostei da prosa e do sarcasmo .
Depois desta o "iluminado" não se mete noutra.


Francisco