30 novembro 2005

Estão a ver?

Escangalho-me, sim, escangalho-me (palavra curiosa, esta) a rir perante um texto de Ricardo Araújo Pereira, que, nas páginas da Visão assina uma coluna (Boca do Inferno) que por norma me faz rir um pedaço. Esta semana, R.A.P. escreve "à Lobo Antunes", com todos os tiques e vícios estilísticos do sempre eterno nobilizável. Não fora a assinatura e eu não saberia quem era quem... Não lhe chega escrever com graça, ser benfiquista e agora pretendente a imitador daquele que é, para mim, o génio da pequena crónica suburbana. Agarrem-me senão desato a falar de toalhas de linóleo (que são a primeira coisa de que me lembro quando falo de Lobo Antunes) e de amores gastos e vidas cansadas. Escangalho-me, sim, escangalho-me, perante um texto de Ricardo Araújo Pereira. Estão a ver?

Mas esta semana está já marcada por outra leitura. As intermitências da morte, a última obra impressa de Saramago é um portento. Falava eu acima de génios. Porque não conhecia em Saramago um humor mordaz como quem brinca aos Deuses (havia qualquer coisa disto no Memorial do Convento) capaz de jogar o (e com o) leitor de uma página para a seguinte como quem diz "espera que logo bebes", mostrar aos sequiosos a garrafa e fazê-la voar em pedaços mais duas folhas depois. Estou tão impressionado com esta nova faceta que ainda só arrisquei trinta páginas, um singelo capítulo, que já voltei a reler como quem diz "ora bolas, isto é tão simples, porque é que não escrevo assim?". Provavelmente porque nunca passarei de um imitador estilístico. Assim, como quem tira à boca seca a libertação da água que tudo leva sem se deter. Sede. Estão a ver?

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