27 abril 2010

III ENEMC (My mistake)

Como até os mais distraídos perceberam, decorreu no passado fim de semana o III Encontro Nacional de Estudantes de Marketing e Comunicação. Não é segredo que fui um dos oradores e às dez e meia da manhã, (sort of), subi ao palco do auditório para falar de Apple e de alguns dos aspectos de marketing cuja experiência acumulei ao longo de alguns anos. Não gosto de fazer palestras durante a manhã. Não é uma mania, sempre achei que o discurso e as ideias fluem melhor noutros horários, e nem sequer me posso queixar porque fui eu mesmo quem escolheu o horário de participação. Não é só uma questão de fluência e frescura de raciocínio (quem acha que falar em conferências é uma questão de scripts decorados pode ir andando que mais tarde ou mais cedo terá um lindo enterro...) vai um pouco para lá disso.

A interacção com a plateia jovem (que a um Sábado de manhã tem fortíssimas hipóteses de ainda estar semi-adormecida...) pode não ser imediata, dizia que que a interacção se quer imediata e que uma recepção mais morna ou mesmo fria pode comprometer o arranque de uma palestra. Centrei-me nos aspectos que poderiam cativar a assistência. Ao contrário do que se possa pensar e conheço muito profissional que não partilha da mesma opinião, dos desastres de palco (sim, já tive alguns e entre eles alguns que foram épicos), retira-se muitíssimo material para estudo posterior e com o tempo aprendemos a usar alguns desses exemplos negativos e a exorcizá-los de forma definitiva. Ali o importante, mais do que "vender o meu peixe" (coisa que como sabeis, acabo sempre por fazer...) era transmitir experiências e mesmo que por vezes o tenha feito de uma forma algo dura ou violenta, mostrar que nem sempre a teoria condiz com a prática quando estamos sob fogo na vida profissional real. Dois momentos que considero chave nesta palestra (são de facto três, mas um é menor a bem dizer...): Apesar de a plateia e o ambiente não serem hostis (que las hay, las hay...), houve um ponto chave no período de Q&A (Perguntas e Respostas). Há uma consideração vinda da plateia que referencia negativamente o produto em foco. Ao palestrante cabe decidir numa fracção se ignora o comentário e segue "strictly as planned" ou o contrapõe e parte para uma "briga" de resultados imprevisíveis. Tomei a minha opção, mas deixem-me (antes de explicar qual) quais os pressupostos. A um orador sob fogo da plateia cabe equacionar se a) Acredita firmemente no argumentário que defende B) Se o produto lhe dá confiança para partir com ele para a "guerra". Nem sempre os pontos coincidem e se for o caso, cabe ao orador defender-se e escolher um plano de fuga de uma situação negativa. (Podem sempre usar o argumento de que não há tempo, ou de que será preferível discutir o assunto no aftermath da sessão). Se não acredita firmemente e não tem experiência do assunto que defende em palco, proteja-se, os resultados podem ser devastadores se você perder a confiança da plateia. Por isso mesmo, quando um dos participantes do encontro se referiu ao produto (Numa pergunta retórica, na qual não vislumbrei maldade) como um "tijolo tecnológico", tomei a minha decisão. Guerra com ele. Exemplos práticos de como fazer, de como produzir, de como tentar reduzir a pó a referência negativa. E só decidi partir para o confronto directo porque já tinha tomado o pulso da plateia. Sabia, por experiência, que se se contarem aliados na assistência no período de Q&A, tudo será mais fácil. Sim, deveria ter, qual treinador de futebol, interrompido ali a sessão e ter explicado o que se deve ou não fazer numa sessão de confronto. My mistake! Também eu, deslumbrado com a oportunidade de "ver sangue", me entusiasmei com o despique e parti para a luta verbal. Do ponto de vista pedagógico perdeu-se ali mesmo uma boa oportunidade de ensinar os participantes a contornar uma dificuldade que não estava no script. (Para quem esteja agora a ler isto e tenha participado na sessão, é uma boa nota para tirar...). O segundo momento é um faits-divers mas é algo que tenho testado intensamente ao longo das últimas conferências que tenho proferido. Estou a fazer uma "cura" de multimedia e invisto cada vez mais no conteúdo oral e menos nos aspectos gráficos. E faço-o porque passei a entender nas minhas próprias formações um desinvestimento na área da pirotecnia de slides e num enriquecimento da matéria a comunicar. Desde Coimbra há uns meses que tenho experimentado receitas nesta área e os resultados têm sido entusiasmantes. Já nas Jornadas de Marketing do ISCAP, nesta mesma semana tinha produzido bons resultados e foi repetida a experiência. Proporciona um ambiente mais informal, é mais cativante da atenção da plateia, mas não é recomendável a quem não domine na íntegra a capacidade de comunicar e raciocinar em simultâneo. Se não tem material gráfico de apoio, o perigo da "branca" é maior, e a fluidez pode ser comprometida. Tenha isto em atenção...

Apontei, nos minutos que reservei à auto-análise desta palestra, uma ou duas falhas que devem ser focadas e corrigidas em sessões futuras: No período de Q&A um dos assistentes dirigiu-se-me em língua inglesa e pediu explicitamente (por provável cortesia para com a restante plateia) que respondesse em português. Ignorei o pedido e respondi na mesma língua em que fui interpelado. Não viria nenhum mal ao mundo por esse facto, não se tivesse dado o caso de a resposta se ter alongado bem mais do que era suposto. (Nota pedagógica: Se você não avaliou os conhecimentos linguísticos da plateia durante o "warm-up" da sessão, é um risco desnecessário que pode perfeitamente dispensar (Veio-me à memória uma sessão em Albufeira que foi conduzida smultaneamente em inglês, português e francês. Apesar de ser fluente nas três línguas, foi um pesadelo que dificilmente voltarei a repetir, se sobretudo estiver sóbrio...). A segunda falha, também no período Q&A, deveu-se a uma percepção por ventura incorrecta da própria pergunta (Targets e segmentações de mercado), que foi respondida com alguma brutalidade. Recordo-me de ter usado a frase "Show me the money!" para justificar as apetências do mercado mass-consuming. Teria hoje respondido de outra maneira, talvez de forma mais delicada. Não sendo relevantes estas questões, são ainda assim parte do meu balanço.

Um último ponto sobre a pedagogia, no capítulo "Má imprensa", tema que levantou algum interesse dos participantes. Dei alguns conselhos sobre a matéria, mas não exemplifiquei em detalhe. Surgiu-me hoje, no decorrer do meu dia de trabalho a possibilidade de o fazer, e se tiverem a paciência necessária para ler o meu próximo post neste mesmo blog, poderão, quem sabe aprender alguma coisa.

Já tive oportunidade de me dirigir à Comissão Organizadora do III ENEMC e felicitá-los pelo evento. Renovo essas felicitações e do mesmo modo quero saudar o Prof. Luís Veríssimo (Projecto Manhattan), o orador que me antecedeu pela colaboração prestada durante a sessão.

3 comentários:

Ricardo Antunes disse...

Tu conheces isto, mas como fazes deste post uma lição sobre Apresentações, deixa-me linkar aqui o Kawasaky, com a sua regra 10/20/30:

A descrição: http://blog.guykawasaki.com/2005/12/the_102030_rule.html#axzz0mLF9ynt7

O vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=liQLdRk0Ziw

Ana, Dona do Café disse...

Tive imensa pena por não ter podido comparecer ao IIIenemc; nos outros anos tinha decorrido em Aveiro e neste mudou para Lisboa e a agenda complicou-se.
Os erros em ocasiões destas são mais gaffes perdoáveis e às vezes são eles que marcam a diferença e que suscitam o interesse, com certeza que talvez tenha servido para despertar parte do público :D
A nossa plateia às vezes dita o rumo da nossa apresentação, por muito preparada que tenha sido a nossa apresentação e, saber responder a uma questão 'mais delicada' também demonstra o nosso 'jogo de cintura'...e saber fazê-lo bem, é um dom.
Agradeço as suas palavras mas ainda fiquei com mais pena de não ter ido :D

Unknown disse...

Essa do tijolo tecnológico deu muito que falar...

http://www.youtube.com/watch?v=Q9NP-AeKX40&feature=player_embedded Mas até os gatos se afeiçoam ao tijolo tecnológico.

De facto a apresentação foi um pouco comercial, mas demonstrou a sua paixão pelo produto e amor à camisola. É de louvar.

O que retirei em grande da apresentação foi que devemos investir em ideias avant garde e não desmoralizar por expressões como "tijolo tecnológico".

Achar um aspecto negativo do Ipad, o facto de não ter leitor de cds para mim é abominável. (talvez o yeti devesse ter assistido a essa apresentação...)

Considero Portugal um país que aposta na inovação quando já não há alternativa e apenas depois de um conceito ter muita fama lá fora...

Entristece-me que não sejamos mais inventivos e menos medrosos.