Tamborilo os dedos na mesa do café, enquanto respiro fundo a tentar reunir alguma paciência para com o meu interlocutor. É um dos tais specimens que me irrita profundamente, principalmente pela arrogância da ignorância que se não cansa se alardear. Não importa a discussão, a conversa, o monólogo, que é mais isto do que se trata porque há muito deixei de responder. Aquilo que me detém é que o personagem não é um qualquer zé-ninguém, mas sim uma figura de relevo na hierarquia militar. Diz disparates técnicos que não devia dizer, rematados por um "está a perceber?" que me deixa interiormente furioso e capaz de ser até mal educado na interpelação. Sou salvo por um dos presentes que sem o saber impede que eu faça ruir a muralha da inteligência artificial que lhe emana dos galões. Há uma dúvida técnica sobre armas brancas e a legalidade do comprimento de determinada lâmina. Sua excelência inverte o rumo da conversa e abençoa-nos a todos com uma prédica sobre o tema, no final da qual aproveito para, delicadamente, pensar em evadir-me da minha própria fúria. O recém chegado não se contenta com o discurso e pede autorização para mostrar o artefacto. Obtido o militar assentimento, do bolso traseiro emerge uma vistosa navalha de ponta e mola que suscita assobios a alguns dos presentes e que é de pronto cuidadosa e cientificamente observada por aquele a quem minutos antes me tinha apetecido esganar. Mira-lhe o cabo delicadamente trabalhado e a esguia lâmina. Mede-a em dedos. Detém-se na inscrição da gola do aço e diz com ar impante. "Hummm... Stêinlésse. Boa navalha! Tenho lá uma da mesma marca...". Levanto-me como se tivesse sido anavalhado. A assistência lá permanece a beber da sapiência do senhor Major...
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6 comentários:
De há uns anos para cá que a stainless detém o monopólio de objectos metálicos usados no corte!
O que não falta por ai são Majores...
Fantástico!!!
Já "tava" com saudades destas crónicas. Tázz a ver. :)
João "Cabo Verde" Matos
Bem-vindas sejam as pulgas!
Tenho um Major desse tipo nas imediações da minha residência.
Ele sabe tanto que o trato carinhosamente por ALMIRANTE!
Não li até hoje que tratar alguém por esta patente militar pudesse ser ofensivo.
... Tá mal!!! Tá mal!!! Mas que porra!... Assim, ficou-se sem saber, se era uma navalha, stêinleze em enóxe?!?!
Regarder les autres « d’en haut », c’est une lame à double tranchant !
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